A Cidade de Deus
Santo Agostinho
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Esta é uma colecção de notas pessoais da leitura da obra A Cidade de Deus de Santo Agostinho. De modo algum substitui a leitura desta obra-prima, e pretende naturalmente aliciar o leitor a conhecê-la em profundidade. As reflexões aqui apresentadas não são as de Santo Agostinho, mas as minhas, inspiradas na palavra do santo.
LIVRO II
Capítulo XX
A felicidade de que queriam gozar e o género de vida que queriam levar os que acusam os tempos da religião cristã
Santo Agostinho escreveu A Cidade de Deus no ano de 410 d.C., e mais de 1.600 anos volvidos custa identificar os aspectos em que esta nossa civilização fez real progresso. Claro que isto é uma hipérbole, mas não deixa de me vir à mente a ideia da sociedade moderna como um bando de pagãozecos com telemóveis e tecnologia wireless.
Desde o advento de Cristo, todas as gerações se têm confrontado com algum grau de anti-cristianismo, o que é natural devido à tensão inevitável que aparece quando o homem se confronta com as suas falhas, quando entende que deve largar certos apegos, e ainda mais quando percebe que nunca chegará à perfeição de Cristo – pelo menos nesta vida é muito improvável.
Nem o Cristo nem o cristianismo proíbem coisa alguma; denunciam, porém, os comportamentos, atitudes e valores que levam – de facto – o homem à perdição de si próprio. O cristianismo (e o Cristo) pretende, acima de tudo, revelar à humanidade o Pai comum e salvar o que nela existe de valoroso – as almas espiritualizadas. Para isto, a verdade tem lugar nuclear, e por este motivo, tudo é exposto à luz, e nada permanece oculto.
O que achei curioso no Cap. XX (Livro II) do livro de Santo Agostinho – e é este o objecto deste texto – foi a semelhança entre a minha sociedade e a sociedade que ele descreve nesse capítulo (uma sociedade anterior ao advento de Cristo).
Resumindo, eis como ele pinta esse quadro: é uma sociedade na qual as suas partes pouco se importam se é corrompida e imoral, desde que o seguinte seja satisfeito:
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que cada um aumente as riquezas e que elas cubram as prodigalidades com que os poderosos mantêm submissos os débeis;
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que os pobres (o povo), enchendo a barriga, estejam dispostos a agradar os ricos (os chefes), e que sob a protecção deles desfrutem de uma pacifica ociosidade; que esses ricos abusem dos pobres aumentando assim a sua clientela para serviço do próprio fausto;
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que os aplausos e os agradecimentos dos pobres sejam para os que são generosos com os seus vícios, e não para os que defendem os seus interesses;
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que não se dêem ordens difíceis ou se proíba o que é impuro;
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que os reis se preocupem, não com o bem, mas com a submissão dos seus súbditos;
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que o povo sirva, não com sinceridade, mas com temor, os seus governantes – não por serem moderadores dos costumes, mas por serem os donos dos seus bens e provedores dos seus prazeres;
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que as leis sirvam mais para proteger “a vinha alheia” do que para proteger a vida própria;
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que haja prostitutas públicas em abundância;
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que sejam frequentes as festas e o entretenimento, e que haja uma estrutura que sustente uma rede de vícios de todos os níveis;
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que seja considerado inimigo público aquele que se desagrada com tais comportamentos e tal falsa felicidade – «e se algum pensar em alterá-la ou suprimi-la, que a multidão, senhora da sua liberdade, o afaste dos nossos ouvidos, o expulse de casa, o tire de entre os vivos»;
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que se tenham por verdadeiros os deuses (pagãos) que proporcionam aos povos esta felicidade (e, no nosso caso actual, que se tenha como falso Aquele que mostra o Caminho da felicidade Verdadeira).
A ala anti-cristã gosta de culpabilizar o cristianismo pela infelicidade e alienação do povo. Para quem está “fora” do universo de Jesus, que não O conhece minimamente, ou que não deseja ainda conhecê-lo, é muito fácil perpetuar essa ideia, pois por meio de séculos de associação psico-emocional, o conceito de cristianismo foi contaminado, e poucos são os que realmente o aprofundam. Mas os que se arriscam a fazê-lo descobrem de facto uma Boa Nova.
Pergunto-me há quanto tempo a humanidade funciona nesta dinâmica, e quanto mais leio, mais me convenço de que sempre foi assim: o ódio à virtude disfarçado de auto-estima e generosidade é um excelente instrumento nas mãos dos ímpios para distorcer a realidade.
Muito há ainda para ser dito. Haja coragem!
21 de Março de 2021
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