A Vida Intelectual
A.-D Sertillanges
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Este resumo não se propõe a substituir a leitura da bela obra do Pe. Sertillanges, mas pretende apresentar o núcleo dos ensinamentos por ele transmitidos, aliciando o leitor a conhecê-la em profundidade. Uma das finalidades no LABORATORIUM é fazer uso do conhecimento do passado ao olhar o presente, portanto procuraremos atender aos problemas contemporâneos ao estudar esta obra. Este resumo é, simultaneamente, um manual de estudo e uma reflexão filosófica.
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Capítulo III – A organização da vida
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ORGANIZAÇÃO: do Latim ORGANIZARE, de ORGANUM, “instrumento musical, implemento, órgão do corpo”, literalmente “aquele que funciona”, relacionado ao Grego ERGON, “trabalho”.
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Este capítulo trata de sugerir a forma de organização ideal para uma vida intelectual frutífera. É mister relembrarmos que a vida intelectual não se reduz às puras abstracções do pensamento, mas está estreitamente ligada ao mundo empírico. A produção intelectual que não tenha como fundamento a experiência humana real é um meio de alienação, e conduz-nos no sentido oposto ao que pretendemos aqui.
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I – Simplificar
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Este conselho é especialmente válido para o nosso século. A maior parte de nós pertence a uma classe cujo estímulo cultural, se é que pode usar-se este termo, é essencialmente o entretenimento de massas.
Quando Sertillanges nos pede para simplificar, ele refere-se sobretudo aos estímulos. Todo o estímulo gera uma reacção, e podemos categorizar os estímulos que recebemos do meio social e seus efeitos em graus de benefício ou malefício no que toca ao nosso sentido moral, ou, em última instância, a todo o nosso ser.
Os estímulos produzem desejos ou aversões; é a repetição deste fenómeno que vai tecendo a nossa personalidade e o nosso carácter. Este processo dá-se por meio de um elemento moderador, e este é tanto mais eficaz quanto mais exercitado – ele é a consciência. Não pretendemos aqui fazer uma complexa reflexão sobre o que é a consciência, mas apenas referir-nos ao facto de que ela é volátil, ou dito de outra forma, ela pode conduzir-nos para níveis elevados ou para níveis reduzidos de compreensão.
No mundo externo, especificamente na sociedade de massa, a estimulação é excessiva e direccionada para transformar os indivíduos em consumidores de vacuidades. Ser consumidor é uma faculdade própria do homem, como é a faculdade de ser produtor. O ponto está no conteúdo consumível, e é esse que passa pelo filtro da consciência, que pode, ou transformá-lo em matéria de carácter, ou transformá-lo em matéria de compostagem.
“Não vos deixeis tomar por essa engrenagem que pouco a pouco toma o tempo, as preocupações, as disponibilidades, as forças. Os preconceitos não são os vossos ditadores. Guiai-vos por vós próprios: obedecei a convicções, não a ritos, e as convicções dum intelectual devem sempre referir-se ao fim que tem em Vista.”
Vale a pena trazer para a reflexão um factor que impacta por vezes a totalidade das nossas vidas - a pressão social. Que cada um pergunte a si mesmo quantas das suas ideias são influenciadas por terceiros. Uma boa parte das nossas ideias e crenças vem de fora, mas existe uma diferença entre aquelas que nós adoptamos por ignorância e mimetismo, e aquelas que trabalhamos activamente dentro de nós, tornando-as nossas porque nelas vemos a verdade. É isto que significa "guiai-vos por vós próprios: obedecei a convicções".
Em suma, o ideal da simplificação de Sertillanges é reduzir a quantidade de estímulos, e simultaneamente melhorar a sua qualidade. Por exemplo, em vez de gastar dinheiro em mudas de roupa diárias, gastemos em livros; em vez de gastar tempo a ouvir fofoquices, gastemos a ouvir os clássicos da música; enfim, no lugar de despender recursos para futilidades, dispendamo-los para fins da nossa instrução e do aperfeiçoamento do nosso serviço.
É especialmente importante a redução dos fardos para aqueles de nós que não têm a sorte de poderem ocupar-se a tempo inteiro do trabalho intelectual.
“Vocação é consagração. O intelectual é um consagrado, não vá portanto dispersar-se em futilidades exigentes.”
Conselho aos esposos dos intelectuais
Neste subcapítulo, Sertillanges emite um conselho às esposas de homens intelectuais. Visto que esta obra foi escrita em 1920, a forma como o autor expõe a sua orientação é adequada para a sua altura. A sugestão continua válida nos nossos dias, mas devemos expandi-la ou adequá-la sem reduzir a sua essência.
A ideia fundamental é apoiar o parceiro no seu trabalho, tornar-se um ponto de suporte, ao invés de ser um vórtice de distracção e desvio. Isto é válido quer seja o intelectual mulher ou homem, e pode mesmo ser válido com qualquer profissão de bem ou aspiração moral do indivíduo.
Para quem deseja viver "a dois", o relacionamento tende a ser um ponto de gravitação, isto é, o estado do nosso relacionamento facilmente influencia o resto da nossa vida. Quando ele funciona, tudo funciona melhor, nos sentimos bem, motivados, produtivos no nosso trabalho; quando ele não funciona, torna a nossa experiência mais angustiante, e o nosso trabalho também sofre.
O relacionamento é um espaço onde afloram as nossas inseguranças e medos. O que fazemos com isso? Temos duas opções: fazer disso nossa matéria de trabalho e curar tais feridas, ou então vergar-nos à mágoa e entrar em processos destrutivos. Aqui importa sobremaneira quem é o nosso par - ele nos ajuda ou nos esmaga?
“Se o homem casado está "dividido" de algum modo, que esteja também duplicado. Deu-lhe Deus uma auxiliar semelhante a si: que ela não se torne outra.”
Por fim, as suas considerações sobre as crianças:
“As crianças (...) reflectem-vos amorosamente a natureza e o homem, e defendem-vos assim do abstracto; reconduzem-vos ao real, a esse real cujo comentário seus olhos interrogadores esperam de vós. Suas frontes puras pregam-vos a integridade, irmã do saber; e a facilidade em acreditar, em esperar, em sonhar grandes planos e em aguardar tudo da paternidade que os guia, não será também para vós, pensadores, uma elevação e um motivo de esperar? Vêde a imagem de Deus e um sinal dos nossos destinos imortais nessa imagem do porvir.”
Ideias-chave deste subcapítulo:
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Reduzir os estímulos e melhorá-los na qualidade.
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Preferir consumir conteúdo que nos instrui intelectual e moralmente, em detrimento daquele que nos esvazia.
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Se num casal um dos membros cumpre uma função intelectual, o outro deve ser um apoio, não um alienante.
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O exemplo que devemos tirar das crianças é a pureza da sua curiosidade, desejo de conhecer e capacidade de aprendizagem.
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II – Guardar a solidão
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A solidão que aqui se fala é o retiro da agitação do mundo. É a técnica por meio da qual nos permitimos entrar no espaço e tempo do silêncio, deixamos que ele nos ordene por dentro e abra o caminho para a clareza e o discernimento. É um dos requisitos da simplificação da vida.
S. Tomás de Aquino aconselha-nos: «Quero que sejas lento em falar e lento em ir à sala de visitas». «Nunca te intrometas na vida alheia». «Mostra-te amável para com todos», mas «não sejais muito familiar com ninguém, porque a demasiada familiaridade gera o desprezo e dá matéria a muitas distracções».
A "demasiada familiaridade" refere-se àquele ponto nas relações em que se perde o respeito próprio da cordialidade. É desejável ter alguém com quem partilhar intimidade, seja um amigo ou um amante, porém, quando a frequentação se torna hábito, corremos o risco de "coisificar" o outro, e daí pode nascer o desprezo.
Sertillanges prossegue estabelecendo uma analogia entre o isolamento do retiro e «a vida silenciosa, à noite»:
“Na noite astral e na sua vacuidade solene afeiçoou Deus o universo: quem quiser saborear as alegrias criadoras, não se apresse a pronunciar o Fiat lux, nem sobretudo passe revista a todos os animais do mundo; nas sombras propícias, à imitação do Criador, tome o tempo de dispor a matéria dos astros.”
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FIAT LUX: Haja luz; locução latina retirada do primeiro livro da Bíblia, o Gênesis, indicando que, após a criação do céu e da terra, o dia foi criado, separando-o das trevas, da noite.
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Que bela imagem! E que útil para nós, sobreviventes do 3º milénio, entender como devemos posicionar-nos perante as trevas. Numa era em que se dissemina em todos os cantos a doutrina da felicidade a qualquer custo, a hipóstase do paraíso terrestre, e a negação activa da possibilidade da dor, que alívio nos traz este conselho.
Como dominará o homem as trevas, senão reflectindo a Luz? E como reflectirá ele a Luz, se não se tornar um espelho limpo? Se a superfície da sua alma é turva e manchada por dedadas alheias, ele reflectirá apenas a sujidade. A solidão traz clareza e limpidez, o retiro propicia a inspiração.
“A solidão permite-vos o contacto convosco, contacto necessário, se quiserdes realizar-vos e não ser o papagaio de fórmulas aprendidas, mas sim o profeta do Deus interior que fala a cada qual uma linguagem única.”
Retiremos deste subcapítulo o essencial: para o trabalho a que nos propomos, é necessário que nos conheçamos a nós próprios, e se queremos conhecer-nos, temos de desbastar a mata cerrada que nos cerca: as ideias e crenças que nos são impostas por força ou que adoptamos pela nossa ignorância. Para isto é necessária a solidão - o contacto com nós mesmos.
Ideias-chave deste subcapítulo:
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A solidão é necessária para nos conhecermos a nós mesmos.
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A solidão é o retiro periódico da agitação do mundo.
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A solidão ordena os pensamentos e traz clareza.
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No ofício intelectual é indispensável o mergulho na noite silenciosa.
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III – Cooperar com os seus iguais.
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Falamos na importância da solidão, mas também referimos no Capítulo I que o intelectual não é um isolado. Estar entre a multidão dispersa-nos; estar entre iguais eleva-nos; estar perante o próximo - aquele que precisa da verdade - faz parte da nossa função.
Procuramos o equilíbrio, e para isso olhamos para o exemplo mais elevado - Jesus Cristo. Ele mostrou-nos a fórmula perfeita para fluir entre estes dois lugares: a comunhão com o Pai e a comunhão com os homens. Se não chegarmos a ser como Ele, pelo menos que o tentemos imitar.
“Aquele que se crê unido a Deus, sem estar unido a seus irmãos, é mentiroso, afirma o apóstolo; não passa de um falso místico e, intelectualmente, de falso pensador; mas o que está unido aos homens e à natureza sem estar unido com Deus no seu íntimo, sem ser cliente do silêncio e da solidão, é apenas vassalo dum reino de morte.”
A melhor companhia para os homens e mulheres de vocação intelectual são aqueles que partilham da busca da verdade com o mesmo desejo, o mesmo respeito, e os mesmos objectivos. As uniões em que de facto eles cooperam para um fim comum, ancorado na verdade, beleza e bondade, são desejáveis.
Muitos de nós, quando ingressam na vida de estudos por conta própria, por necessidade do espírito, e em completo isolamento, nos deparamos com uma espécie de vazio - as pessoas com quem "comunicamos" estão, na sua maioria, ou mortas, ou distantes e inacessíveis: falamos com elas no pensamento, e elas connosco por meio dos seus livros. Somos levados a fazer um esforço extra para manter a motivação e a persistência, e não é fácil.
Cooperar com iguais nesta vida de estudos será um suporte inigualável, pois essas uniões podem tornar-se vórtices de energia e força, libertando de nós o peso de nos mantermos no caminho sozinhos. Não devemos esmorecer enquanto não encontrarmos os nossos iguais, mas manter a esperança e a constância no nosso trabalho.
“A amizade é a maiêutica que extrai de nós os mais ricos e íntimos recursos; desdobra as asas dos sonhos e dos obscuros pensamentos; inspecciona os juízos, experimenta as ideias novas, entretém o ardor e inflama o entusiasmo.”
Ideias-chave deste subcapítulo:
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Estar entre a multidão dispersa-nos; estar entre iguais eleva-nos; estar perante o próximo - aquele que precisa da verdade - faz parte da nossa função.
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Procuramos o equilíbrio, e para isso olhamos para o exemplo mais elevado - Jesus Cristo.
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As uniões em que podemos cooperar para um fim comum, ancorado na verdade, beleza e bondade, são desejáveis.
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Não devemos esmorecer enquanto não encontrarmos os nossos iguais, mas manter a esperança e a constância no nosso trabalho.
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IV – Cultivar as relações necessárias
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“Há relações necessárias que fazem parte da vida do intelectual, uma vez que não separamos o intelectual do homem. Compete-vos ligá-las à intelectualidade, de sorte que não a embaracem, mas a sirvam.
Isto é sempre possível. Nunca malbaratado o tempo que se consagra ao dever ou à necessidade real; o cuidado, que se lhe dispensa, faz parte da vocação, e só a contraria se a considerássemos abstractamente, à parte da Providência.”
Ingressar numa vida de estudos não é colocar a vida de parte - é utilizá-la como matéria no nosso ofício. Por mais que uma pessoa se isole, continua a ter mais similaridades do que diferenças com os membros da sua espécie. Por exemplo, todos nós nos apaixonamos, todos nós sofremos, e todos nós precisamos de um sentido na vida - mesmo que alguns adoptem como sentido a falta de sentido. Da mesma forma, todos precisamos de nos alimentar e de nos aquecer. Vejamos como pela necessidade física estamos ligados em relações inquebráveis, inevitáveis para a sobrevivência individual, e consequentemente da espécie.
O isolamento leva-nos à timidez exagerada, à inadequação, e, no pior caso, à perda do sentido da espécie. Não podemos esquecer-nos que somos parte de um sistema. Não o sistema político, mas o sistema humano. Não podemos simplesmente ignorar os outros ou retirarmo-nos da presença humana sem sofrer algum tipo de distúrbio mental. Mais vale trabalhar para melhorar o sistema do que privar-se dos possíveis frutos.
Conectar com os outros é exercício vital, pois se nos enterramos nos livros, passaremos a ver as pessoas como frases ou objectos de estudo, e elas são muito mais que isso.
Eis a atitude perfeita do intelectual consagrado: olhar tudo com as lentes do ofício, aproveitar tudo para o trabalho, e estar sempre disponível para servir o próximo. Mais uma vez, ainda que não consigamos ser perfeitos, não desistamos de tentá-lo.
“Há na riqueza infinita do real tesouros que vos podem instruir, basta que a frequentemos em espírito de contemplação, e que não a desertemos. E não será porventura o homem o que nela há de mais importante, o homem centro de tudo, fim último de tudo, espelho de tudo e que convida o pensador a permanente confrontação?”
Leibniz dizia que sempre retirava utilidade, até da leitura dos piores livros. Do mesmo modo, o intelectual consagrado saberá retirar utilidade das piores situações, dos momentos mais mortificantes, do confronto com as pessoas mais desumanas, e mesmo dos seus próprios defeitos e enfermidades: «que se convertam em valores, por meio de qualquer indústria feliz da grandeza de alma».
E como tratar os outros? Por meio da soberania do nosso espírito e do nosso coração - eles nos mantêm firmes e elevados em ambientes medíocres, ao passo que em ambientes nobres acentuam as marcas do bom carácter; falando apenas o que é necessário, guardar o silêncio, relevar as entrelinhas e aliciar o outro à descoberta do que não foi dito.
Ideias-chave deste subcapítulo:
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Ingressar numa vida de estudos não é colocar a vida de parte - é utilizá-la como matéria no nosso ofício.
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O isolamento leva-nos à timidez exagerada, à inadequação, e, no pior caso, à perda do sentido da espécie.
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Eis a atitude perfeita do intelectual consagrado: olhar tudo com as lentes do ofício, aproveitar tudo para o trabalho, e estar sempre disponível para servir o próximo.
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O intelectual consagrado saberá sempre retirar utilidade de qualquer situação.
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Devemos tratar os outros por meio da soberania do nosso espírito e do nosso coração.
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V – Conservar a dose necessária de acção
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“A vocação intelectual estritamente tomada, é o contrário da acção; a vida contemplativa e a vida activa estiveram sempre opostas, como oriundas de pensamentos e aspirações contrárias. A contemplação recolhe; a acção gasta; uma chama pela luz, outra ambiciona dar.”
O que mais marca este capítulo que nos sugere como organizar a vida é a importância do equilíbrio. Notemos também que em cada sugestão está subjacente o valor da integridade. A dose necessária de acção, para nós, é aquela que se coaduna com a dose de solidão, silêncio, estudo, e frequentação social.
A acção em si também é significativa, isto é, Sertillanges não nos pede que façamos, de vez em quando, qualquer coisa de qualquer maneira, mas sim que a nossa acção seja, em primeiro lugar, consciente - «A acção regulada pela consciência prepara-a para as regras da verdade, dispõe-na para o recolhimento, une-a à Providência, que é também fonte de verdade. O pensamento e a acção têm um Pai comum.»
Em segundo lugar, que seja coerente com a nossa finalidade - e por isso ele sugere que nos envolvamos com «obras de luz», empreendimentos que produzam bons frutos e que sejam uma continuidade do nosso trabalho intelectual.
“O corpo que se imobiliza demasiado, atrofia-se e enerva-se; a alma que o imita, estiola-se e, pouco a pouco, arruína-se. À força de cultivar o silêncio, corre-se o risco de chegar ao silêncio de morte.”
Um dos maiores riscos do desequilíbrio na função intelectual é perder-se na abstracção. Grande parte do trabalho é leitura e escrita, e o nosso mundo povoa-se de palavras. É essencial que mantenhamos a prática de reportar os significados das palavras aos seus referentes na realidade. Nunca esquecer: trabalhamos com a realidade, com os elementos da realidade - as coisas concretas, os conceitos, e as relações. Trabalhamos com as substâncias.
As ideias estão nos factos. Nós captamos a substância das coisas e formulamos as ideias. O pensamento deve beber alternadamente dos dois mundos: o real e o ideal. Nem tudo na nossa vida humana partilhada é "construção social" e, aliás, pouca coisa o é. As construções sociais são deveras superficiais, isto é, enquadra-se mais nessa categoria o tipo de roupa que usamos, do que o facto de usarmos roupa.
O fracasso em firmar o pensamento na realidade desemboca em delírios colectivos, muitos dos quais presenciamos hoje, por exemplo, as ideologias criadas a partir da ideia de que o sexo (feminino ou masculino) é uma escolha, ou certas concepções de igualitarismo puro, que revelam mais da ignorância de quem as adopta do que oferecem um sistema de facto possível.
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REAL: do Latim REALIS, “verdadeiro, relativo às coisas que existem”, de RES, “coisa, matéria”.
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IDEAL: Do Latim IDEALIS, “conteúdo, o que é existente numa ideia”, derivado do Grego IDEA, literalmente “forma, aspecto”, derivado de uma fonte Indo-Europeia WEID-, “ver”.
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“Enfim, o instrutor, que é a acção, é ao mesmo tempo professor de energia, cujas lições não serão inúteis a um solitário. Pelos incentivos e resistências, pelas dificuldades, pelos reveses, pelos êxitos, pelo aborrecimento e cansaço que obriga a vencer, pelas contradições que suscita e pelas necessidades novas que cria, a acção estimula e retempera as forças, sacode a preguiça fundamental e a orgulhosa quietação, tão hostis ao pensamento como às realizações.”
Ideias-chave deste subcapítulo:
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A dose necessária de acção, para nós, é aquela que se coaduna com a dose de solidão, silêncio, estudo, e frequentação social.
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A nossa acção deve ser consciente e coerente com a nossa finalidade.
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Um dos maiores riscos do desequilíbrio na função intelectual é perder-se na abstracção.
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É essencial que mantenhamos a prática de reportar os significados das palavras aos seus referentes na realidade.
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Trabalhamos com os elementos da realidade - as coisas concretas, os conceitos, e as relações.
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As ideias estão nos factos. Nós captamos a substância das coisas e formulamos as ideias.
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O pensamento deve beber alternadamente dos dois mundos: o real e o ideal.
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O fracasso dos intelectuais em firmar o pensamento na realidade desemboca em delírios colectivos
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VI – Manter o silêncio interior
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«Um intelectual deve ser intelectual todo o tempo». Dissemos no Capítulo I que bastam duas horas por dia para se dedicar à vida de estudos - isto é, por duas horas concentrar sua atenção no estudo concreto. E no resto do tempo? O intelectual consagrado dá a sua vida ao serviço da verdade, independentemente das circunstâncias.
“O que S. Paulo sugere ao cristão: quer comais, quer bebais, quer façais qualquer outra coisa, fazei tudo para Glória de Deus, deve aplicar-se ao cristão que busca à luz. A glória de Deus é, para ele, a verdade: deve pensar nela em toda a parte, dobrar-se a ela em tudo.”
O silêncio interior, especialmente quando nos encontramos nos afazeres sociais, é a técnica por meio da qual nos mantemos livres, íntegros, e abertos à verdade, ainda que tudo ao nosso redor nos queira levar à mediocridade.
É pelo silêncio interior que se abre o caminho da inspiração; é por ele e pela oração que se cuida desse caminho, limpando-o das ervas daninhas, construindo a calçada e libertando-o de obstáculos.
Mais importante que nunca, hoje, na era das redes sociais digitais, e após o advento global de uma alegada pandemia, é manter o silêncio interior. Somos chamados a um serviço, e para realizá-lo bem necessitamos ter a presença constante daquele que nos chamou.
“A solidão, que lhe é recomendada, não consiste tanto na solidão de lugar quanto na solidão de recolhimento; é mais elevação do que afastamento; consiste em isolar-se pelo alto, graças ao dom de si às coisas superiores e mediante a fuga das leviandades, das divagações, da mobilidade e de todos os caprichos da vontade; realiza o conversatio nostra in caelis do apóstolo, estabelecendo a nossa morada e o nosso comércio no céu dos espíritos.”
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CONVERSATIO NOSTRA IN CAELIS: «Nossa cidadania está no céu»
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Ideias-chave deste subcapítulo:
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Um intelectual deve ser intelectual todo o tempo.
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O intelectual consagrado dá a sua vida ao serviço da verdade, independentemente das circunstâncias.
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O silêncio interior é a técnica por meio da qual nos mantemos livres, íntegros, e abertos à verdade, ainda que tudo ao nosso redor nos queira levar à mediocridade.
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Somos chamados a um serviço, e para realizá-lo bem necessitamos ter a presença constante daquele que nos chamou.
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A solidão desejável consiste em isolar-se pelo alto, graças ao dom de si às coisas superiores e mediante a fuga das leviandades.
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NO PRÓXIMO CAPÍTULO
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Capítulo IV – O tempo do trabalho
I – O trabalho permanente
II – O trabalho nocturno
III – A madrugada e os serões
IV – Os instantes de plenitude
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